Estava eu voltando para casa depois de um dia qualquer na faculdade (tipo assim, hoje) discutindo com minha namorada quando argumentei algo que parece ter feito o mundo dela ruir. A discussão era a respeito de laços afetivos familiares, e ela ficou estupefata quando descobriu que eu não consideraria jamais um irmão meu um filho de meu pai com uma qualquer aí. Ora, deixaria ele de ser seu irmão? – ela me pergunta, no que eu respondo que ele jamais seria meu irmão pelo puro fato de eu não precisar de mais nenhum irmão neste estágio de minha vida. Ela acometida com um ar de quem ouvira uma profunda heresia evita meu olhar e começa uma tentativa de me converter à uma visão familiar bem estruturada e cercada de parentes, eu já experiente com minha visão de mundo individualista continuo acreditando que não preciso de mais parentes dos que eu considero realmente “minha família”. Para defender minha capacidade de não amar alguém simplesmente por ser o meu sangue, expliquei que não consigo amar ninguém à distância e como já usufrui de todos os laços afetivos familiares para me tornar a pessoa que sou, descobrir um novo parente, ainda que um irmão de sangue, não influenciaria mais na minha vida do que um amigo. A partir daí a conversa se generalizou e descambou para aspectos globais envolvendo o ser humano.
Eu desenvolvi uma teoria de que o ser humano é feito de necessidades que precisam ser preenchidas, já nasce com elas e só se satisfaz quando elas são preenchidas, como, por exemplo, as figuras paternas, todo ser humano nasce com a necessidade de ter a figura de um pai, limitador e que irá ensiná-lo até onde ele pode ir sem transgredir, e de uma mãe, protetora e que representa a cura para os seus ferimentos. Essas figuras nem sempre precisam ser um pai e uma mãe, podendo ser transferidas para outras pessoas próximas, como uma criança de rua que se afeiçoa às primeiras pessoas que o oferecerem amor. Tudo isso acontece porque somos feitos de necessidades. Necessidades de nos sentir amado, necessidade de amar, necessidade de conhecer, de tentar, de criar, de provar algo para os outros.
Ela não se convencia, não gosta de acreditar no homem como um animal individualista que faz tudo apenas para preencher suas necessidades básicas, afinal, disse ela, ela se sente bem em fazer o possível para ajudar os outros. Claro, penso eu, é uma necessidade dela ajudar os outros que só pode ser preenchida assim.
Ela, cabeça dura que é, se recusou categoricamente a compreender o que eu argumentava e disse: “Não quero entender. Pronto!” No que eu respondi imediatamente: “Não quero mais um irmão. Pronto!”
Somos feitos de necessidades, e você vem satisfazendo as suas?